Entrevista com o prof. Mateus Gianni Fonseca, secretário regional da ANPMat da região Centro-Oeste.

1- Fale um pouco sobre sua formação, trajetória e atuação no Ensino de Matemática.

Iniciei minha carreira em Matemática com a licenciatura, concluída em 2008 em uma pequena Faculdade Privada do Distrito Federal. Já durante o curso, atuava em aulas de acompanhamento escolar e em projetos extras ligados à Sociedade Brasileira de Educação Matemática – o que muito ajudou a despertar meu interesse pelo Ensino de Matemática.

Após a conclusão da licenciatura, cursei uma Especialização em Educação Matemática ao mesmo tempo em que iniciei a atuação como professor de curso preparatório para concursos públicos – Foi uma experiência interessante, mas que não correspondia exatamente aos meus anseios profissionais.

No ano de 2010 ingressei como professor da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal. Neste local fiquei mais satisfeito e realizado enquanto profissional, trabalhando com a Educação de Jovens e Adultos. E aplicar os métodos mais diferentes que havia estudado em prol de uma educação significativa me deixava cada vez mais empolgado.

Em 2012, ingressei no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Brasília (IFB). Uma instituição que me proporcionou o que eu precisava para avançar ainda mais com aquilo que acreditava e acredito ser a Educação Matemática que precisamos.

Dessa forma, ingressei em 2014 no Mestrado em Educação e em 2016 no Doutorado em Educação, ambos concentrados na temática Educação Matemática, mais precisamente, sobre o assunto “Criatividade em Matemática”.

Durante este período tive a oportunidade de visitar escolas em diferentes países e conhecer diferentes teorias educacionais ligadas ao ensino de matemática. Tive a oportunidade também de avançar com a produção acadêmica – sou co-autor do livro ‘Criatividade em Matemática: conceitos, metodologias e avaliação’; e co-organizador do livro ‘Criatividade em matemática: lições da pesquisa’.

Além disso, com o apoio dos Professores Cleyton Gontijo e Alexandre Carvalho, mantenho o projeto ‘Biblioteca Virtual de Pesquisas em Pensamento Crítico e Criativo em Matemática’ – um repositório que trata exclusivamente dessa temática que tanto investigamos; e com o apoio do Professor Mauro Alencar, o projeto de divulgação científica ‘Matemática das Coisas’, pois acreditamos que precisamos conquistar o gosto pela matemática da sociedade.

Atualmente, além de Secretário Regional Centro-Oeste da ANPMat, sou Diretor de Ensino, Pesquisa e Extensão do IFB, campus Ceilândia; e Segundo líder do grupo PI: Grupo de Pesquisas e Investigações em Educação Matemática – UnB.

2- Como você vê a importância da atuação da ANPMat no atual cenário?

Acredito que a ANPMat é importante para nos fortalecermos enquanto profissionais responsáveis pelo ensino e pela reflexão sobre a educação matemática do País. Acredito que é importante para estimular o network e o consequente compartilhamento de experiências entre professores que estão inseridos nos mais variados contextos. Além disso, acredito ser importante para que hajam ofertas sistemáticas de formação continuada.

3- Na sua opinião, o que podemos fazer para melhorar o ensino de Matemática na Educação básica do Brasil?

Eu responderia essa pergunta com outra pergunta: Que matemática queremos de nossos cidadãos? Ou melhor: Que esperamos dos egressos da educação básica? Pergunto isso porque tenho a impressão de que algumas vezes a fragilidade do conhecimento matemático de muitos se inicia a partir de um contato equivocado acerca do que é matemática. Falas como “sou bom em matemática, basta eu saber a fórmula” é um exemplo da visão reducionista que muitos acabam construindo em suas jornadas; quando na verdade, a meu ver, a matemática deveria ser apresentada como uma forma de pensar e que, sim, utiliza de inúmeras fórmulas, mas que demanda interpretação, elaboração de hipóteses, testagem, etc.

Além disso, existem outras questões que devem ser consideradas também para melhorar o ensino de matemática na educação básica. Dentre elas, maior financiamento das instituições escolares e valorização do professor.

Por fim, é importante destacar iniciativas como a da ANPMat, que se propõe a manter aceso o debate acerca dessa melhoria – afinal, a constante reflexão é ponto de partida para que possamos propor inovações a cada dia.

4 – Você passou por alguma experiência que tenha transformado você como profissional, que tenha levado você a chegar onde está hoje?

Com certeza a pós-graduação mudou minha vida. Com ela, alcancei maior projeção profissional, não só financeira, mas de reconhecimento mesmo. Além de ter conseguido conhecer pessoas e países que me enriqueceram com um capital cultural que achava que nunca teria.

O Doutorado, por exemplo, me propiciou a oportunidade de conhecer a Austrália. Fui para aprimorar minha pesquisa e voltei com uma experiência ímpar, tendo realizado conexões, aproximado de escolas, experimentado outra cultura – elementos que enriquecem o meu ser e com certeza implica na pessoa que sou hoje. Parece até que vivi 5 anos em 3 meses. Gostaria que todos vivenciassem este tipo de experiência.

É necessário sair da zona de conforto para ver outras formas de organização, bem como para que possamos ampliar nossas opiniões. Hoje sou completamente realizado em minha profissão e empolgado em continuar contribuindo para com a Educação Matemática.

5- Como está sendo a sua experiência com as aulas e atividades on-line? Alguma dica que considera interessante para o ensino remoto?

Estou como supervisor local de Pibid no meu campus. E tem sido uma experiência gratificante.

Quando em contato com o Coordenador do projeto, Professor Cleyton Gontijo, combinamos que faríamos o Pibid como uma sequência de oficinas que estimulassem o pensamento crítico e criativo em matemática de alunos do 1º ano do ensino médio. Ora, a ideia era fantástica e estava alinhada ao que tanto eu quanto ele, estamos produzindo há alguns anos.

Inclusive, a ideia era de que os pibidianos organizassem as oficinas a partir de um modelo que nós mesmos havíamos elaborado e testado em outras ocasiões. A diferença foi conduzi-las em formato remoto. As oficinas contam com diferentes fases: possuem um momento de aquecimento, de aproximação com a tarefa, de um problema investigativo, de sistematização do conteúdo, de retrospectiva e de projeções futuras. E têm sido realizadas de forma satisfatório, inclusive percebendo que alguns estudantes que antes diziam não ser criativos têm mudado de ideia.

Alguma dica que considero importante para registrar? Acredito que o principal sejam as atividades de aquecimento – normalmente colocamos alguns desafios ou curiosidade no início da videochamada para que os estudantes possam pensar e oralizar diferentes respostas. Embora esse aquecimento nem sempre seja acerca do conteúdo principal da aula, serve muito para “quebrar o gelo” entre os alunos, deixando-os mais à vontade para o que vem a seguir.

6- Você fala em pensamento crítico e criativo em matemática. Acredita que é possível estimular este tipo de pensamento mesmo agora quando ainda estamos em ensino remoto?

Sim. Afinal, a ideia do pensamento crítico e criativo é justamente termos a capacidade de pensarmos soluções diferentes a um problema. Sendo assim, é hora de utilizamos de nosso pensamento crítico e criativo como professores, tanto quanto podemos provocar os estudantes a assim também pensarem.

Oferecer problemas pelos quais os estudantes devem refletir e agir como matemáticos é um caminho – é oferecer oportunidades para que possam investigar, hipotetizar, testar…

Uma diferença entre o formato presencial e o remoto, a meu ver, é o tempo que o estudante pode pensar para fazer algumas tarefas. Quantas vezes, em sala de aula, tivemos que acelerar o passo para dar conta do conteúdo trabalhado, ou mesmo para não perdermos o controle de disciplina em turmas muito heterogêneas, furtando momentos que alguns estudantes precisavam para reflexão? Não digo que o formato remoto é melhor, mas que não tendo que manter uma sala de aula cheia de diferentes personalidades, cada estudante tem mais liberdade para pensar, para refletir. Tem seu tempo.

Gosto de pensar que os momentos síncronos devem buscar acender uma fagulha de curiosidade, de modo a deixá-lo pensando no assunto e consequentemente gerando ideias. Ideias que poderão se converter em soluções de problemas. Ideias que poderão servir para que ele perceba o potencial que possui em fazer matemática. Ideias que são criadas a partir de seu pensamento crítico e criativo em matemática.